Eu postaria um texto na caixa de comentários abaixo da postagem da Regina. Mas decidi “abrir” mais uma postagem, por conta de algo que queria partilhar com o grupo desde a sexta passada.
Saí do nosso encontro com vontade de dizer algo, que tenho pensado ao analisar minha história como professora e ao ler o que identifico como alguns incômodos nossos quando dizemos ( ou nos dizem) de uma “mudança necessária da escola”.
Penso, que um pouco por conta da minha personalidade e outro (um “pouco” um tanto maior) por conta da minha formação, olho para decepções, alguns ditos “fracassos” e outros momentos de dificuldade como situações para que eu repense minhas ações. Isso na vida de maneira geral e de maneira mais intensa na escola, como professora.
Não, nada comparado ao Dalai Lama ou à Polianna...rs.. Estou dizendo de um jeito de fazer autocrítica. De tomar aquilo que me mobiliza para reflexões com objetivo de fazer mudanças para melhor... e tomar isso como parte do trabalho.
E aprendi (acho que todos nós sabemos disso) que independente do âmbito da vida, as mudanças de nossos modos de agir/pensar/sentir não são fáceis de acontecer!
Fiquei com vontade de dizer isso à vocês por conta de nossa conversa a respeito do comportamento de alunos e alunas na escola. Da maneira como vemos mudanças de comportamento em alguns meninos (principalmente) que vão “adolescendo” e tornando-se desrespeitosos conosco, agressivos com os colegas, ou mesmo nos mais novos que passam muitas horas nas ruas e aprendem meios de conseguirem o que querem das maneiras mais inimagináveis para nós e que nos chocam...
Quando fiz coro à alguns relatos neste sentido, quando vejo em mim a dificuldade em lidar com estes meninos, penso nas condições sociais, penso na estrutura da escola, penso naquilo que exijo e que exigem de mim como professora, mas antes de tudo isso, ou melhor, acho que quase ao mesmo tempo - quase que simultanemente e diariamente...- penso na minha presença na vida daquele menino que me desafia e o que eu posso ter produzido para que me desafiasse ( às vezes sem ele nem perceber que me incomoda!)
Não, não acredito que eu sozinha “me culpe” única e exclusivamente, ou que eu vá tomar toooodo o meu trabalho e jogar fora “por conta de uma criança”, como às vezes repetimos ( e não sei porquê! Quem faz isso? Isso existe?), MAS o trabalho não será mais o mesmo! Nem no minuto seguinte, nem no dia seguinte! Mesmo que eu não mude meu planejamento e a forma de colocá-lo em prática!!
Isto para mim é uma verdade!
As crianças (todas!!!) marcam o trabalho quer eu queira ou não.
E pensar em como eu venho marcando cada uma delas é necessário para que o trabalho caminhe...
E digo: não, sozinha não faço isso!!!
Isso aprendi também.
Agradeço todos os dias à forças divinas que nomeamos de diferentes e mais belos jeitos: eu nunca me senti sozinha!!!
E nunca duvidei de mim mesma sozinha! Porque o que penso para meu trabalho, não penso sozinha.
Se duvido dele, corro à partilhar a dúvida! E convido (sempre e primeiro, que isso não é novidade para ninguém) a Simone, meu marido (sim, ele não escapa!), outras colegas e amigas que trabalham na escola, ou não, pesquisadores da UNICAMP... convido quem compartilha das minhas apostas a duvidar delas também!
Acho que esta é a nossa grande riqueza: sermos incompletos, inacabados! Quem “me disse isso” primeiro foi o Paulo Freire... Quando consegui entender o que ele dizia, passei a entender o que meu pai me disse algumas vezes em que eu o magoei em minha adolescência ( naqueles anos em que achamos que sabemos as respostas para o mundo! E o problema é que ninguém nos entende! rs)
Assumo minha “incompletude”, ainda melhor quando não a vejo só em mim e sei que sozinha não darei conta dela!
Acho que por isso, digo que pensamos o tempo todo na educação e no ensino das crianças e não damos conta destes da maneira como entendemos que é nosso dever...
Aqui eu começo a “conversar” com o texto da Regina, que me provocou...
Rê, acho que este tem sido o nosso foco!!! Sempre!
Por acreditar que podemos dar conta, digo com traquilidade, sem desmerecer ou desvalorizar o que temos feito: estamos fazendo algo (ou algos! rs) errado! Eu, inclusive! Eu-não-só!
Uma das questões apontadas há anos é o “afinar” das regras: a escola tem que colocar limites nos alunos e eles tem que saber o que é certo e o que é errado. Isso a Regina também coloca no texto. É mesmo um grande desafio, para uma escola com corpo docente, gestor e funcionários em constante mudança, mesmo que seja pouca mudança ano a ano...e com um número insuficiente de adultos por alunos ( na minha opinião). Além das diferentes visões e modos de cada um se organizar e da demanda cada vez maior de tarefas que cai sobre nós.... MAS continuamos apostanto nisso, não temos como abrir mão.
Temos mesmo que dar esta “segurança” às crianças, adolescentes, jovens e alunos adultos também!.... Com qual olhar para eles?
Acreditamos que eles podem se auto-organizar, por exemplo, e colaborar com uma organização dos espaços, tempos, regras, encaminhamentos a serem feitos caso não sejam cumpridas?
Ou entendemos que as regras são “historicamente dadas”, que quem pode repensar uma ou outra na instituição são os professores e gestores (os funcionários nem participam) e para fazer cumprir, “fechar o cerco” é a única solução?
Coloquei dois extremos e apelei para estereótipos de formas de lidar com regras na escola... Mais para dizer que ao olhar para cada ação planejada coletivamente, estas questões que temos discutido no GT fazem cada vez mais sentido. E que se não damos conta do que queremos ensinar, o “peso da balança” que mede “culpados” pelo fracasso das apostas não pode estar mais para um lado do que para outro... nem tanto os alunos, nem tanto nós... (quem segura a balança, mesmo?)
E por estas escolhas serem parte constituinte da gente e da escola, penso que podemos encarar "de frente", como parte do trabalho coletivo, o que entendemos como erros nossos, sem desqualificar nossos esforços! Pensar porque escolhemos promover ações “desta ou daquela” forma. Acho que isso é possível e muito coerente e produtivo!!
E deixo um trechinho do Paulo Freire... porque foi inevitável lembrar ao ler a Regina dizendo sobre “as sementes que plantamos” e escrever sobre nossa incompletude:
“Pensar que a esperança sozinha transforma o mundo e atuar movido por tal ingenuidade é um modo excelente de tombar na desesperança, no pessimismo, no fatalismo. Mas, prescindir da esperança na luta para melhorar o mundo, como se a luta se pudesse reduzir a atos calculados apenas, à pura cientificidade, é frívola ilusão. Prescindir da esperança que se funda também na verdade como na qualidade ética da luta é negar a ela um dos seus suportes fundamentais. O essencial como digo (...) desta Pedagogia da esperança, é que ela, enquanto necessidade ontológica, precisa de ancorar-se na prática. Enquanto necessidade ontológica a esperança precisa da prática para tornar-se concretude histórica, É por isso que não há esperança na pura espera, nem tampouco se alcança o que se espera na espera pura, que vira, assim, espera vã.
Sem um mínimo de esperança não podemos sequer começar o embate mas, sem o embate, a esperança, como necessidade ontológica, se desarvora, se desenderereça e se torna desesperança que, as vezes, se alonga em trágico desespero. Daí a precisão de uma certa importância em nossa existência, individual e social, que não devemos experimentá-la de forma errada, deixando que ela resvale para a desesperança e o desespero. Desesperança e desespero, conseqüência e razão de ser da inação ou do imobilismo.
Nas situações-limites, (...) se encontram razões de ser para ambas as posições: a esperançosa e a desesperançosa.
Uma das tarefas do educador ou educadora progressista, através da análise política, séria e correta, é desvelar as possibilidades, não importam os obstáculos, para a esperança, sem a qual pouco podemos fazer porque dificilmente lutamos e quando lutamos, enquanto desesperançados ou desesperados, a nossa é uma luta suicida, é um corpo-a-corpo puramente vingativo” (FREIRE em Pedagogia da Esperança, 1992, p.10 e 11 - grifos meus)
Mafê.
16/06/2011.